Ilson Enk
A meningite
neonatal (MN) é entidade clínica decorrente de processo infeccioso nas
meninges, diagnosticada entre o nascimento e o 28º dia de vida. Em nosso meio,
sua incidência varia de 0,3 a 1 caso por 1000 nascidos vivos, sendo maior que a
de países desenvolvidos, onde oscila entre 0,2 e 0,5 em 1000 nascidos vivos.
A meningite
neste período constitui entidade singular, uma vez que a etiologia, o quadro
clínico e as complicações são diferentes do observado nas demais idades.
Os agentes
infecciosos chegam ao sistema nervoso central (SNC) mais comumente por via
hematogênica, fator que associa a meningite com bacteremia ou septicemia em
75%, ou mais, dos casos. A MN ocorre em até 15% dos RN com bacteremia. Infere-se portanto
que os patógenos que causam a sepse neste período são os mesmos responsáveis
pelas meningites.
ETIOLOGIA
A idade do
neonato pode sugerir a forma de aquisição e o agente etiológico da meningite:
na primeira semana de vida considera-se fortemente a possibilidade de doença de
transmissão vertical, por germes da flora materna: Streptococcus do
grupo B, Escherichia coli e Listeria monocytogenes. Passado este período, os
germes são adquiridos na comunidade ou do ambiente hospitalar, dependendo do
perfil do paciente, se estava ou não hospitalizado. Passa-se então a cogitar de
outros Gram-negativos e/ ou espécies de Staphylococus.
Embora Haemophilus
influenzae tipo B, pneumococos e meningococos possam eventualmente afetar recém-nascidos
(RNs), são relativamente raros, em contraste com suas altas incidências após o
período neonatal.
Os germes mais
identificados nas meningites de transmissão não vertical, ocorrendo após a primeira
semana de vida, são: Streptoccocus grupo B em manifestação tardia,
(especialmente tipo III), Escherichia coli (80% das vezes com antígeno
K1), Listeria monocytogenes e, menos frequentemente outros organismos
gram negativos (espécies de Klebsiella, Enterobacter e Pseudomonas).
Mais raremente, podem determinar meningite: Flavobacterium meningosepticum,
Citrobacter, Staphiloccocus epidermidis e aureus Estes dois últimos,
juntamente com agentes fúngicos, em geral estão associados a situações
específicas, como lesões abertas, derivações ventrículoperitoniais, ventilação
mecânica e prematuridade com hospitalização prolongada.
FATORES DE RISCO
Normalmente, na
presença de bolsa íntegra, o feto desenvolve-se em ambiente estéril, adquirindo
flora bacteriana somente após o nascimento. Aspectos maternos, perinatais e
próprios do RN podem predispor a colonizações anormais e processos infecciosos:
· Prematuridade
· Baixo peso ao
nascer
· Gemelaridade
· Asfixia
perinatal
· Ruptura
prematura de membranas
· Febre materna
periparto
· Corioamnionites
· Infecções
maternas do trato urinário ( ITUs)
· Malformação do
SNC e colocação de válvula ventrículo-peritonial.
Naturalmente a
ocorrência de bacteremia ou septicemia neonatal, precoce ou tardia, representa
o mais fator de risco, por invasão do agente infeccioso no SNC.
ACHADOS CLÍNICOS
Como na maioria
das afecções deste período, os sinais e sintomas da MN são inespecíficos,
superpondo-se aos de infecção sistêmica neonatal:
· Instabilidade térmica
· Irritabilidade ou
letargia
· Tremores, alterações
de tônus muscular, crises convulsivas
· Intolerância
alimentar, vômitos
· Apnéia, desconforto
respiratório
· Bradicardia
Sinais neurológicos
clássicos de irritação meningorradicular não costumam ser identificados.
Portanto, toda investigação de sepse deve incluir a pesquisa de líquido cefalorraquidiano (LCR), sendo a punção lombar
(PL) um procedimento essencial para a precocidade diagnóstica da MN.
DIAGNÓSTICO
O diagnóstico de
certeza para MN é a cultura positiva do LCR. As alterações de celularidade,
proteínas e glicose no LCR, no entanto, são aceitas para estabelecer o
diagnóstico e o tratamento:
§ Aumento dos
leucócitos (> 30 células/microlitro) com predomínio de polimorfonucleares
(neutrófilos).
§ Aumento das proteínas
(> 150 mg/ dl no prematuro e > 100 mg/ dl no RN a termo). Se houver
proteínas aumentadas sem aumento de células, descartar abcesso cerebral, TORCH
e hemorragia intracraniana.
§ Diminuição da glicose
(< 20 mg/ dl no prematuro e < 30 mg/ dl no RN a termo): correlacionar com
glicemia.
Nenhuma fórmula para correção de hemorragia no liquor é confiável: frente a presumidos acidentes de punção, individualizar a conduta,
provavelmente repetindo a PL em 24- 48 h..
Os exames de
imagem (ultrassonografia, tomografia computadorizada, ressonância magnética) podem
ser utilizados para descartarem outras patologias ou complicações, como abscessos,
hidrocefalia, coleção subdural, vasculites, trombose e hemorragia.
TRATAMENTO
Antibioticoterapia –
Meningite precoce (primeira semana de vida):
Ampicilina +
Gentamicina
Se houver forte
suspeita de meningite por gram negativo (ex: gram do liquor com gram negativo)
usar Ampicilina + Gentamicina (*) + Cefotaxima (***) ou Cefepime, até resultado
de antibiograma.
Meningite tardia (após a primeira semana de vida):
RN hospitalizado –
Cefotaxima (***) ou Cefepime + Vancomicina (**) + Amicacina (*)
RN não hospitalizado
– Ampicilina + Gentamicina (*) + Cefotaxima (***) ou Cefepime.
(*) o uso de aminoglicosídeo associado depende
do protocolo da cada serviço.
(**) dose
ajustada para penetração no SNC)
Duração do tratamento –
Regra geral :21 dias.
Pode ser reduzido para 14 dias na MN por estreptococcus B,
estafilococcus coagulase negativa ou Listeria.
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