quinta-feira, 15 de março de 2012

Distúrbios hidroeletrolíticos

Francisco Bruno 

A água é a principal constituinte do corpo humano; varia desde cerca de 70% do peso corporal no recém-nascido a 60% a partir de 1 ano de vida. Com o crescimento, o líquido intracelular (LIC) passa a predominar sobre o extracelular (LEC). Eles são separados pela membrana celular, que permite o fluxo livre de água até que haja o equilíbrio, mantido pela pressão osmótica. A osmolalidade sérica (285-295mOs/kg) é dependente, na maioria das vezes, quase que exclusivamente do sódio (osmolalidade = 2 X sódio sérico).

O sódio é o principal cátion extracelular e o potássio, o principal intracelular. As proteínas (albumina) presentes no meio extracelular são moléculas grandes e, portanto, de difícil deslocamento. Elas atraem e retêm o sódio e são importantes na manutenção da pressão oncótica do meio extracelular. O cloreto é o principal ânion extracelular, e as proteínas, ânions orgânicos e fosfato predominam no LIC.
O hormônio antidiurético, principal agente do equilíbrio hídrico corporal, é secretado em resposta à diminuição do volume extracelular, principalmente em situações de estresse (trauma, pós-operatório, infecções, drogas). Ele age na porção distal do néfron, aumentando a reabsorção de água, diminuindo o débito urinário e aumentando a osmolalidade urinária.

O volume circulatório corresponde ao líquido intravascular, responsável pela perfusão tecidual. A situação mais frequente de perda de volume em crianças é pela diarréia. Tal situação é agravada com a perda insensível de água pela grande superfície corporal da criança e pela inabilidade de comunicação da sede. Como geralmente não conhecemos a perda real de peso, baseamo-nos na avaliação clínica que, quanto maior for a perda de volume, maior será a repercussão clínica, com alteração da perfusão tecidual, redução da diurese, taquipnéia e letargia. Nessa situação, a reposição rápida se faz necessária, através de soro fisiológico, 20ml/kg a cada 20 minutos, até o restabelecimento da perfusão. O passo seguinte é manter a perfusão e restabelecer as deficiências de líquidos e eletrólitos. Quando não é possível a hidratação oral, ou seja, na desidratação grave, é importante a monitorização sérica dos eletrólitos. O débito urinário e a densidade urinária são úteis para a avaliação do sucesso da terapia de hidratação.

A manutenção hídrica é realizada com volume (soro glicosado 5%) de 1800ml/m2, sódio a 75mEq/l e, desde que o paciente urine, potássio 20mEq/l. Mudanças nesses eletrólitos são guiadas pela avaliação laboratorial, que é realizada diariamente, ou mais freqüente, se as alterações eletrolíticas são significativas e as perdas sustentadas.

Na desidratação, o sódio, normalmente, é perdido na mesma proporção que a água, tratando-se na maioria das situações de desidratação isonatrêmica. Quando ocorrer alteração do sódio, hiponatremia (<130) ou hipernatremia (>150), a correção deve ser feita de maneira a não ultrapassar uma variação sérica de 10mEq/l dia, com controle laboratorial a cada 4-6 horas. A hiponatremia é vista quando são utilizadas soluções hipotônicas por tempo prolongado, na hidratação da criança internada. A hipernatremia é incomum; quando persistente, há formação de solutos protéicos (osmóis idiogênicos), garantindo o volume celular constante.
O potássio é responsável pelo potencial de membrana; assim, maiores alterações podem interferir na atividade celular, sendo fundamental a sua correção. Na hipocalemia, quando o potássio estiver abaixo de 2,5 (mEq/l), corrigimos de forma rápida, com 0,5 mEq/kg/h por 4 a 6h, com monitorização cardíaca contínua e controle laboratorial a seguir. Quando se tratar de hipercalemia e, o potássio estiver acima de 6 (mEq/l), corrigimos imediatamente com proteção miocárdica inicial (cálcio), desvio do potássio para o meio intracelular (bicarbonato de sódio, salbutamol) e remoção do excesso de potássio através de suas resinas trocadoras.

Outros distúrbios que podem ocorrer na desidratação são a acidose metabólica, que, geralmente, decorre da perda de bicarbonato intestinal e é corrigida pela reposição hídrica, e a hipoglicemia, principalmente em crianças pequenas, corrigida com soro glicosado a 10%,  2 a 4ml/kg/dose.

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