Helena Müller
Definição de CAD: presença de
hiperglicemia (glicose > 200
mg/dl) e acidose metabólica (pH<7,3 e
BicNa<15 mEq/L).
É a principal causa de
hospitalização em crianças com Diabetes Mellitus (DM) tipo I. Ocorre em até 20-40% das crianças e adolescentes no
momento do diagnóstico de DM tipo I. A
mortalidade situa-se entre 0,2 e 0,5% e é devida principalmente à ocorrência de
edema cerebral, que é a complicação mais grave e mais temida da CAD.
Os principais fatores precipitantes
são o uso inadequado de insulina e as infecções (presentes em 30-40% dos
casos), e em menor frequência problemas emocionais, pancreatite e trauma.
Os achados clínicos principais
são cetonemia, cetonúria, acidose metabólica, hiperglicemia e desidratação, em
graus variados de intensidade de acordo com a gravidade do quadro.
O diagnóstico na maioria dos
quadros não é difícil, com uma história de poliúria, polidipsia, enurese, perda
de peso de algumas semanas que evolui para um quadro de náuseas, vômitos,
anorexia, dor abdominal e fadiga. Ao exame físico o paciente apresenta sinais
de desidratação, respiração acidótica (Kussmaul), depressão do sensório e
hálito cetônico.
Algumas vezes o quadro não é tão típico, a queixa pode ser
somente taquipnéia pela acidose e pode ser confundido com doença respiratória.
Outras vezes alteração do sensório é o principal achado clínico, e deve haver
uma suspeição clínica para que se possa fazer o diagnóstico correto. É
importante lembrar que em todo paciente com alteração de nível de consciência
que procura atendimento deve ser realizado hemoglicoteste (HGT).
As alterações laboratoriais
encontradas são: gasometria com pH
<7,30 e HCO3 <15; glicemia > 250-300 mg/dl; cetonemia e
cetonúria positivas. Hipocalemia e hipofosfatemia são frequentes devido à
poliúria. A hiponatremia é dilucional associada ao aumento da osmolaridade
causada pela hiperglicemia e consumo de líquidos diluídos. Também ocorre o que
chamamos pseudohiponatremia que é a queda
de 1,6 mEq/l (até 2,4) no sódio sérico para cada 100mg/dl de glicose acima de
100mg/dl. Leucocitose com desvio à E também é frequente e não necessariamente
está associada a infecção.
Monitoração e Tratamento: Todo
paciente com CAD deve ser internado em UTI ou Sala de Emergência. A avaliação
laboratorial inicial deve incluir gasometria, hemograma, glicemia, cetonemia,
eletrólitos, uréia, creatinina e cetonúria.
HGT deve ser realizado de 1/1 hora durante infusão de insulina contínua.
Deve ser feito controle de diurese e BH e controle de cetonúria a cada micção.
É importante monitorização cardiovascular e respiratória contínuas e avaliação
do sensório cada hora nas primeiras 12 h.
Os objetivos de tratamento são a
correção da desidratação e dos distúrbios eletrolíticos; a interrupção da
produção de cetonas e redução da glicemia com uso de insulina; a correção da
acidose metabólica através da hidratação e insulinoterapia; avaliação e tratamento do fator desencadeante
e monitorização e tratamento das potenciais complicações.
Inicialmente deve ser infundido SF 0,9% 10-20 ml/kg em 30-60 min para
expansão, que deve ser repetido somente se hipotensão ou choque. A reidratação
deve ser feita em 24-48 horas. O volume recomendado é 2000 a 2500 ml/m2/dia,
inicialmente com SF e K 40 mEq/L. Glicose deve ser adicionada quando glicemia
atingir 250, manter solução isotônica. Recomenda-se não administrar volume
superior a 3500 ml/m2/dia nas primeiras 24 horas.
A insulinoterapia deve ser
iniciada logo após a expansão, com 0,1 U/kg/hora. A redução da glicemia deve ser 75-100 mg/dl/h.
A glicemia recomendada durante o tratamento é 150-200 mg/dl.
Os critérios para suspensão da
insulina contínua são: pH > 7,30, Bicarbonato > 15 e paciente em
condições de ser alimentado.
O uso de bicarbonato de sódio não
é recomendado, não há evidências de benefícios e pode estar associado a efeitos
adversos: hipocalemia, aumento da hiperosmolaridade, acidose paradoxal no SNC,
redução mais lenta da cetonemia e possível relação com desenvolvimento de edema
cerebral. Pacientes com acidose grave (pH<6,9) talvez possam se beneficiar
do uso cauteloso de BicNa - 1-2 mEq/kg
lento em 2 horas.
A complicação mais grave da CAD é
o edema cerebral. A incidência é de 0,3-1% dos episódios de CAD, com
mortalidade de 40-90%. É mais freqüente em crianças < 5 anos e nos pacientes
com diagnóstico “novo” de DM e ocorre geralmente 4-12 horas após o início do tratamento. Existe pouco
entendimento sobre os mecanismos responsáveis
pelo edema cerebral. Os seguintes fatores de risco foram relatados: alterações rápidas na concentração de sódio e
osmolaridade sérica durante o tratamento,
uso de bicarbonato, uso de volumes superiores a 4000 ml/m2/dia,
acidose grave, baixos níveis de pCO2 na admissão, uréia elevada e idade
< 5 anos. Clinicamente ocorre
alteração de consciência, alteração no padrão respiratório, bradicardia e
hipertensão arterial. As alterações tomográficas são tardias. O tratamento deve
ser iniciado imediatamente diante da suspeita clínica. A droga de escolha é o
manitol. Infelizmente a mortalidade é alta.
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