Renato S.
Procianoy *
INTRODUÇÃO
A técnica de
hipotermia tem sido utilizada na última década como um tratamento adjuvante nos
recém-nascidos com idade gestacional igual ou maior que 35 semanas de idade
gestacional com encefalopatia hipóxico-isquêmica.
Há pelo
menos 10 estudos clínicos randomizados descritos na literatura que sugerem uma
diminuição na mortalidade e na ocorrência de disabilidades neurológicas graves
nos pacientes com encefalopatia hipóxico-isquêmica tratados com a técnica de
hipotermia (1-10). Em quatro destes estudos clínicos randomizados, o número de
pacientes envolvidos foi superior a 200 (1,2,5,10).
Estudo de
meta-análise dos resultados destes estudos mostrou que diminui em 19% o risco
de morte e/ou acometimento neurológico aos dois anos de idade e aumenta a
sobrevida sem paralisia cerebral em 53% (11). Resultados semelhantes tem sido
mostrado nos pacientes acompanhados até 5 e 7 anos de idade que foram
submetidos à hipotermia terapêutica (12).
Desta forma,
na recente atualização do programa de reanimação neonatal, há uma recomendação
formal de uso de hipotermia terapêutica no tratamento precoce do recém-nascido
com idade gestacional igual ou maior que 35 semanas com encefalopatia
hipóxico-isquêmica.
MECANISMO DE
AÇÃO
A lesão
cerebral secundária à hipóxia-isquemia se dá em duas fases separadas por um
breve período de latência. Na primeira fase, quando há a fase aguda de hipóxia
e isquemia, ocorre necrose neuronal por deprivação de oxigênio. Após a
reanimação e a reperfusão do Sistema Nervoso Central há um breve período de
latência que não dura mais que 6 horas, seguido pela fase tardia que se
caracteriza pela apoptose neuronal. Essa fase tardia dura por vários dias e a
sua intensidade será a maior responsável pelo neurodesenvolvimento futuro deste
recém-nascido.
Sugere-se
que a hipotermia aplicada no período de latência, portanto, nas primeiras seis
horas inibe os mecanismos de lesão do Sistema Nervoso Central decorrentes da
fase tardia da encefalopatia hipóxico-isquêmica (13,14).
MODO DE
FAZER
Existem duas
formas de aplicar a hipotermia terapêutica: de corpo inteiro ou seletivo da
cabeça. Ambas apresentam resultados satisfatórios.
Em nosso
meio temos utilizado a hipotermia de corpo inteiro. A seguir descrevemos o
protocolo utilizado:
Indicação:
Preencher
ambos os critérios:
1.Evidência
de asfixia perinatal:
gasometria
arterial de sangue de cordão ou na primeira hora de vida com pH <7,0 ou
BE<-16
ou história
de evento agudo perinatal (descolamento abrupto de placenta, prolapso de
cordão)
ou escore de
Apgar de 5 ou menos no 10º minuto de vida
ou
necessidade de ventilação além do décimo minuto de vida
e
2. Evidência
de encefalopatia moderada a severa antes de 6 horas de vida: convulsão, nível
de consciência, atividade espontânea, postura, tônus, reflexos e sistema
autonômico.
Contra-indicação:
Idade
gestacional menor que 35 semanas e 0/7 dias
Peso de nascimento
menor que 1800 gramas
Procedimento:
Esfriamento:
Pré-esfriar
o colchão a 4ºC
Amaciar o
termômetro em água morna
Colocar o
recém-nascido num berço desligado
Colocar o
termômetro no esôfago
Ajustar a
temperatura do paciente em 33,5ºC
Colocar um
lençol entre o colchão e o paciente
Movimentar o
paciente a cada 2 horas para evitar lesão cutânea
Tempo total
de tratamento é 72 horas
Reaquecimento:
Após 72
horas o paciente é lentamente aquecido
Aumentar a
temperatura corpórea 0,5ºC por hora até chegar até 36,5ºC temperatura corpórea
Sinais
vitais a cada 30 minutos durante o reaquecimento
Após o
paciente alcançar a temperatura de 36,5ºC, retirar o colchão e reposicionar o
paciente na incubadora.
Monitorização:
Temperatura
do colchão, pele e esofagiana deve ser monitorizada a cada hora nas primeiras
12 hora e depois de 4 em 4 horas
Monitorização
cardíaca, saturação e PAM invasiva
Sinais
vitais a cada 15 minutos por 4 horas, a cada hora por 8 horas e cada 2 horas
até o final do esfriamento.
Monitorização
da diurese
Glicose,
uréia, creatinina, cálcio, magnésio, TP, KTTP, TGO, TGP e eletrólitos no
início, Glicose, uréia, creatinina, cálcio, magnésio, TP, KTTP e eletrólitos
com 24, 48 e 72 horas após o início da hipotermia. Esses pacientes tem risco
para hiponatremia. É recomendável manter o sódio sérico no limite superior
Gasometria
arterial no início, 24, 48 e 72 horas
Hemograma e
plaquetas no início, 24,48 e 72 horas. Manter as plaquetas acima de 50.000
Controlar a
ingesta e a excreta
Prescrição
básica
PICC,
Cateter de artéria umbilical e veia umbilical.
NPO
Ingesta
hídrica 50 ml/kg/dia TIG 5 mg/kg/min com 1 g/kg aminoácido no primeiro dia e
aumentar 1 g/kg/dia se a criança estiver urinando e a acidose estiver melhor
Morfina EV
contínua na dose 5 a 10 mcg/kg/hora
Ampicilina e
gentamicina (se necessário) em doses habituais
Drogas
vasoativas em caso de necessidade em doses habituais
CONSIDERAÇÕES
IMPORTANTES
1. Para o uso de hipotermia terapêutica não há necessidade do
paciente estar em ventilação mecânica
2. Hipertensão pulmonar e uso de óxido nítrico inalatório não são
contra-indicações para o uso de hipotermia terapêutica
3. Bradicardia com freqüência cardíaca entre 80 e 100 bpm é comum
e não necessita tratamento
4. Se o paciente apresentar hipotensão arterial deve se fazer uso
de drogas inotrópicas
5. O uso de antibióticos é indicado no caso de haver diagnóstico
de infecção neonatal
6. Se houver plaquetopenia (<50.000/mm3) deve fazer transfusão
de concentrado de plaquetas.
7. O
reaquecimento tem que ser lento. Podem surgir crises convulsivas durante o
procedimento de hipotermia e principalmente no processo de reaquecimento. Em
caso de crises convulsivas, o paciente deve ser tratado com drogas
anticonvulsivantes, inicialmente, com fenobarbital: dose de ataque de 20 mg/kg
EV e manutenção de 5 mg/kg/dia em duas doses diárias.
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* Prof.
Titular de Pediatria da Universidade Federal do Rio Grande do Sul
Chefe do
Serviço de Neonatologia do Hospital de Clínicas de Porto Alegre
Presidente
do Departamento de Neonatologia da SBP
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