terça-feira, 12 de junho de 2012

O Recém-Nascido Pré-Termo Tardio

Breno Fauth de Araújo*
O nascimento prematuro é reconhecido como um grave problema de saúde pública, por ser a principal causa de mortalidade infantil e também pelas importantes morbidades neurocognitivas, pulmonares e oftalmológicas.

 Durante muitos anos, a maioria dos estudos sobre a morbi-mortalidade dos recém-nascidos pré-termo (RNPT) tem dado ênfase aos casos extremos, com idade gestacional(IG) inferior a 30 semanas. Nos RNPT com maior idade gestacional, o risco de morte e seqüelas futuras é muito menor, o que fez com que este grupo de conceptos fosse, por muito tempo, considerado um grupo de baixo risco, podendo ser acompanhado nas maternidades seguindo a mesma rotina dos RN a termo. Estes RNPT, até alguns anos atrás, eram denominados de limítrofes ou prematuros quase a termo ou, ainda, prematuros próximos do termo.

 A necessidade de padronizar uma definição que caracterizasse os RNPT com IG próxima do termo fez com que o National Institute of Child Health and Human Development (NICHD) e o National Institutes of Health (NIH) em 2005, organizassem um workshop com essa finalidade. Neste workshop criou-se o conceito de recém-nascido pré-termo tardio (RNPT-T) definido como os RN com IG compreendida entre 34 semanas completas (34/0) e 36 semanas e 6 dias (36/6).

 Esta denominação baseou-se na necessidade de enfatizar que estes RN limítrofes são ainda prematuros e, portanto, não podem receber o mesmo nível de cuidados dos RN a termo.

Definiu-se, portanto, um grupo de risco intermediário de morbidade e mortalidade, com características e necessidades específicas, que os diferencia dos RN de baixo risco e dos RNPT extremos, de maior risco.
A incidência de partos prematuros aumentou nas últimas décadas nos países desenvolvidos, sendo que nos Estados Unidos a incidência passou de 10,6%, em 1990, para 12,8%, em 2006. Este aumento nas taxas de prematuridade foi causado quase exclusivamente pelo aumento de nascimentos de RNPT-T.

Dados dos Estados Unidos nos mostram que em quatro milhões de RN vivos no ano de 2003, 12,3% foram RNPT e destes 71% foram identificados como RNPT-T. O crescimento do grupo de RNPT-T no período de 1998 a 2003 foi da ordem de 40% para um aumento da prematuridade de 31% e o de RNPT extremos de 11%. Em 2005, os RNPT-T corresponderam a 9,1% dos nascidos vivos, caracterizando a importância deste grupo de RN sob o ponto de vista da saúde pública.

Os principais fatores que contribuem para o aumento do número de RNPT-T são o aumento no número de nascimentos por métodos de reprodução assistida, com uma contribuição estimada para o crescimento da taxa de prematuros de 10%; a melhora nos métodos de diagnóstico pré-natal, com o aumento na taxa de interrupções da gestação por indicação médica; o aumento no número de gestantes com mais de 30 anos, uma vez que as mulheres de mais idade têm um número maior de nascimentos múltiplos do que as gestantes mais jovens; a interrupção prematura da gestação por erro na avaliação obstétrica da IG; o aumento do número de gestantes obesas, com o conseqüente aumento de complicações na gestação, como diabete e hipertensão.

Este grupo de RN, somente nos últimos anos começou a ser estudado de forma sistemática e alguns estudos populacionais têm mostrado que a morbi-mortalidade desta população é significativamente maior que a dos RN a termo, com um risco sete vezes maior de apresentar intercorrências no período neonatal em comparação com os RN a termo.

Assim, são descritos menores escores de Apgar, maior freqüência de instabilidade térmica, sucção e deglutição deficientes, hipoglicemia, hiperbilirrubinemia, patologias respiratórias, maior risco infeccioso e maior número de alterações neurológicas.

As principais patologias respiratórias associadas são a doença da membrana hialina e a taquipneia transitória do RN, sendo que a incidência destas patologías diminui para cada semana a mais na IG. Assim, a incidência da membrana hialina foi de 10,5%, 6%, 2,8%,1% e 0,3% para os RN com idade gestacional de 34, 35, 36, 37 e ≥38 semanas respectivamente. Este grupo de RN apresenta, ainda, uma incidência aumentada de apneias, síndrome da morte súbita e uma maior necessidade de reanimação em sala de parto em comparação com os RN a termo.

Em relação à nutrição verifica-se que os RNPT-T apresentam, frequentemente, dificuldades para o  estabelecimento de uma amamentação bem sucedida. Isto ocorre devido à imaturidade dos mecanismos de sucção, deglutição e respiração, o que pode levar estes RN à desidratação por baixa ingesta de leite.

O número de dias de internação deste grupo de RN é, em média, de 8 dias, em comparação com 2 dias nos RN a termo. Ocorre, também, uma maior taxa de admissão em UTI neonatal (36% para o RNPT-T e 7% para o RN a termo) e de readmissão após a alta, sendo as causas mais frequentes a hiperbilirrubinemia, dificuldades de alimentação, pobre ganho de peso, desidratação e apneias.

A evolução neurológica e o desenvolvimento psicomotor desta população são, em grande parte, ainda desconhecidos. Com 34 semanas de gestação, o volume cerebral é 65% do volume que será alcançado a termo. A maturação estrutural nestas semanas finais inclui o aumento da conexão entre neurônios, arborização e conexões dendríticas, aumento das uniões sinápticas e da maturação neuro-química, e dos processos enzimáticos. Por outro lado, o crescimento e desenvolvimento do cerebelo é máximo durante as últimas semanas da gestação e muito sensível às agressões neste período, especialmente pela isquemia, o que pode repercutir sobre as áreas cognitiva, de linguagem e das relações sociais. Um extenso estudo populacional na Noruega demonstrou aumento do risco de paralisia cerebral, retardo mental, esquizofrenia e outros transtornos psicológicos entre os RNPT-T.

É de se salientar, ainda, que mortalidade infantil observada em conceptos que nasceram com idade gestacional entre 34 e 36 semanas é três vezes maior do que em RN a termo, o mesmo ocorrendo com a mortalidade neonatal.

Na prevenção do nascimento de RNPT-T alguns tópicos merecem ser enfatizados:
A interrupção da gestação por cesariana planejada não deve ser feita antes das 39 semanas de gestação.
É importante uma melhor identificação das gestantes que necessitam interrupção da gestação por problemas médicos, sendo necessário melhorar os métodos de avaliação da idade gestacional.
Por se constituírem em um grupo de risco, os RNPT-T devem ser acompanhados e avaliados constantemente pelo pediatra e pela enfermagem durante a sua permanência na maternidade e não devem receber alta hospitalar antes de 48 horas de vida. 

É importante, também, garantir a estes RN uma consulta de reavaliação dois dias após a alta hospitalar para se verificar, principalmente, se ocorreu o estabelecimento adequado da amamentação, se houve perda excessiva de peso e se há necessidade de tratamento da icterícia.
 

*Professor de Pediatria e Neonatologia da Universidade de Caxias do Sul.

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