sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012

Puberdade Precoce



Após termos visto a sequência normal da puberdade no post anterior vamos ver as manifestações da sua precocidade. A puberdade é considerada precoce quando ocorre antes dos 8 anos em meninas e dos 9 anos em meninos. As principais preocupações relacionadas são devido ao déficit de crescimento pela fusão prematura das epífises ósseas e ao desenvolvimento psicológico da criança. A puberdade precoce pode ser dependente ou não do estímulo das gonadotrofinas (LH e FSH). Quando é dependente das gonadotrofinas é a puberdade precoce verdadeira ou central, quando por uma produção autônoma de hormônios sexuais independente de gonadotrofinas é Pseudopuberdade Precoce ou Puberdade Precoce Periférica. Existem ainda variantes do desenvolvimento puberal normal, caracterizadas pelo aparecimento isolado e prematuro dos caracteres sexuais secundários.

Avaliação
Importante colher na história a idade do aparecimento dos caracteres sexuais secundários, o peso e comprimento ao nascer, o uso de alguma medicação, a existência prévia de alguma doença do Sistema Nervoso Central (SNC), a idade da menarca da mãe e da puberdade no pai e em tias paternas. Ver se há casos semelhantes e de baixa estatura na família assim como de hirsutismo.  Além da idade de início dos caracteres sexuais é importante avaliar a velocidade da evolução de um estágio de Tanner para outro.

Usualmente esta evolução demora de 6 a 10 meses entre cada estágio e entre o início da puberdade e a menarca o tempo médio é de 3 anos. A puberdade pode ser, além de precoce, rapidamente evolutiva, passando velozmente de um estágio de Tanner a outro e culminando com a menarca em menos de 1 ano. Determina-se a estatura da criança em relação a sua altura alvo e os estágios de desenvolvimento conforme os critérios de Marshal e Tanner.

Inicia-se a investigação adicional com Raio X de mão e punho para determinação da idade óssea (bem avaliado), ecografia pélvica e exames laboratoriais. Quando há precocidade sexual com estímulo hormonal, independente da etiologia, há avanço da idade óssea em relação à idade cronológica. A ecografia pélvica avaliará o volume uterino, seu aspecto (através das medidas das relações uterinas), o volume dos ovários, a presença e o número de folículos, a presença de endométrio e a circulação de artérias uterinas por doppler e a eventualidade de um tumor ou cisto ovariano. O estradiol basal pode estar baixo, pois tem elevações cíclicas, a testosterona é mais estável e deverá estar elevada quando houver precocidade sexual de origem testicular. Na avaliação basal, além dos hormônios sexuais deve-se avaliar a função da tireóide com TSH e T4 livre, hCG para casos de tumores secretores, os andrógenos adrenais SDHEA e 17 OH progesterona e o LH. Na suspeita de puberdade precoce central o exame de escolha é o teste de estímulo com GnRH, onde se dosam LH e FSH na amostra basal e 30 e 60 minutos após a administração de 75 mcg/ m2 até a dose máxima de 100 mcg de gonadotrofina por via endovenosa. Vários pontos de corte foram validados, mas o atualmente utilizado para a distribuição da medicação pela Secretaria da Saúde é do LH > 5 U/l.

Quando é feito o diagnóstico de Puberdade Precoce Central usualmente avalia-se o SNC por ressonância nuclear magnética.

Puberdade Precoce Central

Tem uma incidência de 1: 5.000- 10.000, sendo muito mais frequente em meninas (3 a 23 X mais). Na maioria das vezes é idiopática (especialmente em meninas), mas pode estar relacionada a tumores do SNC, infecções ou outras patologias neurológicas. É mais comum também em crianças adotadas. Deve-se suspeitar em meninos com volume testicular superior a 3 ml (> ou = a 4 ml) e em meninas com telarca antes dos 8 anos. As crianças apresentam avanço de idade óssea, basais normais ou estradiol e testosterona elevados, teste do GnRH com resposta puberal (pico do LH) e aumento do volume ovariano acima de 1 cm3 com mais de 5 folículos em cada ovário, útero modificando do formato tubular para o formato de pêra e aumento do fluxo uterino ao doppler arterial. A ressonância usualmente é normal, mas pode visualizar um hamartoma hipotalâmico ou outra alteração neurológica.

Telarca Precoce

A telarca precoce é o aumento uni ou bilateral de mamas isolado, sem ser acompanhado de pubarca, menarca, nem avanço da velocidade de crescimento ou da maturação esquelética. Trata-se de uma condição frequente antes dos 2 anos de idade, podendo regredir espontaneamente ou permanecer estável. O Raio X de mão e punho para idade óssea e a ecografia pélvica são os principais exames na avaliação destas crianças. É importante manter um seguimento destas pacientes, pois cerca de 14% podem evoluir para uma precocidade sexual completa.

Pubarca Precoce

Consiste no aparecimento de pelos pubianos antes dos 8 anos em meninas e antes dos 9 anos em meninos. Usualmente é uma variação da normalidade, provocada pela adrenarca (início da secreção de andrógenos adrenais) mais precoce e exarcebada. Porém deve-se excluir hiperplasia adrenal congênita virilizante e outras causas de virilização através da dosagem de andrógenos adrenais e do Raio X de mão e punho para idade óssea. Quando é somente a adrenarca os pelos pubianos podem vir acompanhados de pelos axilares, odor androgênico, comedões, aumento da velocidade de crescimento e discreto avanço da idade óssea, ainda dentro de 2 desvios padrões. Este quadro é mais comum em crianças nascidas pequenas para a idade gestacional (PIG), prematuras e com rápido ganho de peso. As meninas com esta situação clínica têm uma maior incidência na adolescência e vida adulta de hirsutismo e síndrome de ovários policísticos e devem ser acompanhadas clinicamente.

Menarca Precoce Isolada

É uma situação clínica incomum e ainda sem explicação científica. Caracteriza-se por sangramento vaginal isolado antes dos 8 anos de idade, sem outros sinais puberais, sem elevação de estradiol nem de gonadotrofinas, sem avanço da idade óssea e com anatomia de genitais internos e externos normal. Deve-se excluir traumatismo e manipulações.

Puberdade Precoce Independente de Gonadotrofinas



Tratamento da Puberdade Precoce

A Puberdade Precoce Central é tratada com agonistas do GnRH (leuprorrelina, triptorelina, etc) em forma de depósito IM a cada 21 a 84 dias, dependendo da dose e da resposta clínica, radiológica e ecográfica. A manutenção do tratamento usualmente é até 12 anos de idade óssea, ou antes se a clínica indicar.

As puberdades periféricas são tratadas conforme sua etiologia, levotiroxina no hipotireoidismo, corticoterapia na HAC, nas mutações do gene do receptor de glicocorticóides e na insuficiência adrenal primária. A cirurgia é o tratamento de escolha nas causas tumorais. Na testotoxicose e na síndrome de McCune Albright podem ser utilizados agentes progestagênicos (acetato de medroxiprogesterona) e anti-androgênicos (espironolactona e acetato de ciproterona). Na síndrome de McCune Albright utiliza-se também um modulador seletivo do receptor de estrógeno (tamoxifeno) ou inibidores da aromatase (letrozole e anastrazole). É comum a associação de 2 agentes terapêuticos na puberdade precoce independente de gonadotrofinas. Finalmente, as variações do desenvolvimento puberal, como a telarca, pubarca e menarca precoce não tem indicação de tratamento medicamentoso, porém estas crianças devem ser acompanhadas clinicamente e reavaliadas conforme cada caso.

Fonte: Puberdade Normal, Precoce e Atrasada. V Brito, K C M Freitas, E M F Costa, A C Latrônico, B B de Mendonça. Em Endocrinologia. M Saad, R Maciel, B Mendonça. Ed Atheneu 1ª edição


Leila Cristina Pedroso de Paula
Endocrinologista
Endocrinologista Pediátrica
Mestre e Doutora em Endocrinologia pela UFRGS

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