quarta-feira, 25 de abril de 2012

Cetoacidose Diabética (CAD)


Helena Müller

Definição de CAD: presença de hiperglicemia  (glicose > 200 mg/dl)  e acidose metabólica (pH<7,3 e BicNa<15 mEq/L).

É a principal causa de hospitalização em crianças com Diabetes Mellitus (DM) tipo I. Ocorre em  até 20-40% das crianças e adolescentes no momento do diagnóstico de DM tipo I.  A mortalidade situa-se entre 0,2 e 0,5% e é devida principalmente à ocorrência de edema cerebral, que é a complicação mais grave e mais temida da CAD.

Os principais fatores precipitantes são o uso inadequado de insulina e as infecções (presentes em 30-40% dos casos), e em menor frequência problemas emocionais, pancreatite e trauma.
Os achados clínicos principais são cetonemia, cetonúria, acidose metabólica, hiperglicemia e desidratação, em graus variados de intensidade de acordo com a gravidade do quadro.

O diagnóstico na maioria dos quadros não é difícil, com uma história de poliúria, polidipsia, enurese, perda de peso de algumas semanas que evolui para um quadro de náuseas, vômitos, anorexia, dor abdominal e fadiga. Ao exame físico o paciente apresenta sinais de desidratação, respiração acidótica (Kussmaul), depressão do sensório e hálito cetônico. 
Algumas vezes o quadro não é tão típico, a queixa pode ser somente taquipnéia pela acidose e pode ser confundido com doença respiratória. Outras vezes alteração do sensório é o principal achado clínico, e deve haver uma suspeição clínica para que se possa fazer o diagnóstico correto. É importante lembrar que em todo paciente com alteração de nível de consciência que procura atendimento deve ser realizado hemoglicoteste (HGT).

As alterações laboratoriais encontradas são: gasometria com  pH <7,30 e HCO3 <15; glicemia > 250-300 mg/dl; cetonemia e cetonúria positivas. Hipocalemia e hipofosfatemia são frequentes devido à poliúria. A hiponatremia é dilucional associada ao aumento da osmolaridade causada pela hiperglicemia e consumo de líquidos diluídos. Também ocorre o que chamamos pseudohiponatremia que é a queda de 1,6 mEq/l (até 2,4) no sódio sérico para cada 100mg/dl de glicose acima de 100mg/dl. Leucocitose com desvio à E também é frequente e não necessariamente está associada a infecção.

Monitoração e Tratamento: Todo paciente com CAD deve ser internado em UTI ou Sala de Emergência.  A  avaliação laboratorial inicial deve incluir gasometria, hemograma, glicemia, cetonemia, eletrólitos, uréia, creatinina e cetonúria.  HGT deve ser realizado de 1/1 hora durante infusão de insulina contínua. Deve ser feito controle de diurese e BH e controle de cetonúria a cada micção. É importante monitorização cardiovascular e respiratória contínuas e avaliação do sensório cada hora nas primeiras 12 h.

Os objetivos de tratamento são a correção da desidratação e dos distúrbios eletrolíticos; a interrupção da produção de cetonas e redução da glicemia com uso de insulina; a correção da acidose metabólica através da hidratação e insulinoterapia;  avaliação e tratamento do fator desencadeante e monitorização e tratamento das potenciais complicações.

Inicialmente deve ser infundido  SF 0,9% 10-20 ml/kg em 30-60 min para expansão, que deve ser repetido somente se hipotensão ou choque. A reidratação deve ser feita em 24-48 horas. O volume recomendado é 2000 a 2500 ml/m2/dia, inicialmente com SF e K 40 mEq/L. Glicose deve ser adicionada quando glicemia atingir 250, manter solução isotônica. Recomenda-se não administrar volume superior a 3500 ml/m2/dia nas primeiras 24 horas.

A insulinoterapia deve ser iniciada logo após a expansão, com 0,1 U/kg/hora.  A redução da glicemia deve ser 75-100 mg/dl/h. A glicemia recomendada durante o tratamento é 150-200 mg/dl.

Os critérios para suspensão da insulina contínua são: pH > 7,30, Bicarbonato > 15 e paciente em condições de ser alimentado.

O uso de bicarbonato de sódio não é recomendado, não há evidências de benefícios e pode estar associado a efeitos adversos: hipocalemia, aumento da hiperosmolaridade, acidose paradoxal no SNC, redução mais lenta da cetonemia e possível relação com desenvolvimento de edema cerebral. Pacientes com acidose grave (pH<6,9) talvez possam se beneficiar do uso cauteloso de BicNa  - 1-2 mEq/kg lento em 2 horas.

A complicação mais grave da CAD é o edema cerebral. A incidência é de 0,3-1% dos episódios de CAD, com mortalidade de 40-90%. É mais freqüente em crianças < 5 anos e nos pacientes com diagnóstico “novo” de DM e ocorre geralmente 4-12 horas após o  início do tratamento. Existe pouco entendimento sobre os mecanismos responsáveis  pelo edema cerebral. Os seguintes fatores de risco foram relatados:  alterações rápidas na concentração de sódio e osmolaridade sérica durante o tratamento,  uso de bicarbonato, uso de volumes superiores a 4000 ml/m2/dia, acidose grave, baixos níveis de pCO2 na admissão, uréia elevada e idade < 5 anos.  Clinicamente ocorre alteração de consciência, alteração no padrão respiratório, bradicardia e hipertensão arterial. As alterações tomográficas são tardias. O tratamento deve ser iniciado imediatamente diante da suspeita clínica. A droga de escolha é o manitol. Infelizmente a mortalidade é alta.

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