quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

Diarreia aguda

Renata Rostirola Guedes

Conceito: Diminuição na consistência das fezes ou aumento na freqüência das evacuações, com duração inferior a 14 dias, geralmente autolimitada e de etiologia presumivelmente infecciosa – viral, bacteriana ou parasitária. Cursa com má absorção intestinal de água e eletrólitos, podendo acarretar depleção hidrossalina de intensidade variável. O período de incubação dura de 1 a 7 dias. Nos casos de intoxicação alimentar, os sintomas aparecem 6-12 horas após a ingestão. O uso de medicamentos como antiinflamatórios, antibióticos, diuréticos e laxativos também pode provocar diarréia aguda.

Epidemiologia: Em 2004 a OMS estimou em 2,5 bilhões o número de casos de diarréia no mundo, com óbito de 1,5 milhão de crianças menores de 5 anos. No Brasil, em 2010, foram mais de 3 milhões de casos notificados e 3940 óbitos. Crianças até 3 anos de vida tem em média 1 a 2 episódios de diarréia aguda por ano, com pico de incidência entre 6 e 18 meses.

Etiologia:
- Viral (70%): Rotavírus 40%; norovírus e adenovírus 30%
- Bacteriana (20%): Salmonella; Shigella; Escherichia coli
- Parasitária (5%): Giardia intestinalis; Entamoeba hystolitica; Strongiloides stercoralis

Investigação: A realização rotineira de exames NÃO está indicada.
Indicar coprocultura na diarreia: com sangue em menores de 6 meses ou em crianças maiores, quando o quadro for intenso e houver toxemia associada; em crianças menores de 3 meses; em casos com suspeita de sepse de origem gastrointestinal, colite pseudomembranosa ou síndrome hemolítico urêmica; em crianças imunodeprimidas; nos casos de diarréia há mais de 2 semanas, se o resultado positivo for definir o uso de antibiótico.
Para pacientes com desidratação severa, com alteração do nível de consciência, está indicada coleta de: hemograma, gasometria, glicemia, eletrólitos, uréia e creatinina.

Tratamento:
Baseia-se em duas linhas principais: prevenção e correção da desidratação e alimentação.

O soro de reidratação oral (SRO) deve ser administrado na dose de 10mL/kg após cada episódio de evacuação diarréica, independente do tipo de desidratação – iso, hipo ou hipertônica. Crianças sem sinais de desidratação podem fazer uso do SRO em casa, sendo liberadas com orientações. Crianças com desidratação leve a moderada deverão permanecer no hospital fazendo reposição das perdas com SRO até que os sinais de desidratação tenham desaparecido. Na desidratação leve são necessários, para repor as perdas líquidas, cerca de 30-50 mL/kg e na moderada 60-80 mL/kg, divididos em 3-4 horas. A terapia endovenosa está indicada nos casos de desidratação severa; choque; desidratação moderada com incapacidade de hidratar por via enteral - oral ou gastróclise – devido à persistência dos vômitos; íleo metabólico; presença de comorbidades gastrointestinais, como intestino curto e ostomias.

Crianças com desidratação leve a moderada devem começar a receber sua dieta habitual dentro das primeiras 4 a 6 horas após iniciada a reidratação. Não está indicada mudança para uma dieta especial, nem redução do aporte de gorduras. Retirar lactose da dieta apenas se houver sinais de intolerância aos açúcares com fezes explosivas, espumosas e assaduras, além de diarréia que dure mais de 14 dias.

Antibióticos: nos casos de diarréia com sangue e repercussão sobre o estado geral, ácido nalidíxico 50 mg/kg/dia, de 6/6h, por 5 dias.

Probióticos: não existem evidências que demonstrem que o uso de probióticos reduz as perdas fecais. Seu uso não está indicado e onera o tratamento.

Não usar antiespasmódicos, drogas anti-motilidade ou qualquer outro fármaco com finalidade antidiarréica.
Usar paracetamol em casos de dor abdominal significativa.

Prevenção: aleitamento materno exclusivo até 6 meses de vida; higiene das mãos e cuidado com a manipulação de alimentos; saneamento para destinação adequada das excretas; vacinação contra rotavírus.

3 comentários:

  1. Dra. Renata,
    Eu andei fazendo uma revisão no site UPTODATE esses dias e vi uns dados relevantes sobre reposição de zinco em casos de diarreia aguda. Aparentemente tem uma boa resposta, principalmente com redução do tempo de doença. Poderia comentar algo a respeito? Obrigado.

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Apesar de ainda muito pouco utilizada em nosso meio, estudos mostram que a suplementação oral de zinco durante a diarréia aguda ou persistente diminui a duração e gravidade da mesma. Também diminui a chance de recorrência nos 3 meses seguintes. As doses de zinco (preferencialmente na formulação sulfato de zinco) recomendadas pela OMS na diarréia são de 10mg por dia por 10 a 14 dias em menores de 6 meses e de 20 mg por dia em maiores de 6 meses.
      Referências: Lukacik M, Thomas RL, Aranda JV. A meta-analysis of the effects of oral zinc in the treatment of acute and persistent diarrhea. Pediatrics, 2008; 121(2):326-36 e diretrizes da OMS (WHO)

      Excluir
    2. Obrigado pelas informações. Vou tentar dar uma lida nas referências. E parabéns pelo blog, muito interessante e útil não só aos pediatras que estão fazendo o TEP para também para quem quer se manter atualizado.

      Excluir